O meu onze ideal (V)
Após um interregno algo prolongado, retomo a escolha daquele que é, para mim, o onze ideal do Benfica, constituído por jogadores que eu tive a oportunidade de ver jogar.
Defesa Central
Ricardo Gomes
No final da época de 1987/88, em que o Toni, pegando na equipa a meio da temporada, e com um grupo de jogadores em geral pouco conhecidos chegou à final da Taça dos Campeões Europeus, os benfiquistas sofreram um rude golpe. Numa manobra traiçoeira, quebrando o pacto de cavalheiros vigente, o presidente do FC Porto, Pinto da Costa, 'roubou-nos' dois jogadores titulares indiscutíveis, e que tinham sido pedras fundamentais nessa boa campanha europeia: Dito e Rui Águas (também, quem é que estaria à espera que Pinto da Costa respeitasse um acordo de cavalheiros, se ele nunca soube o significado da palavra 'cavalheiro'?).
Mas, tal como parece estar a acontecer hoje no caso Miguel/Nélson, há males que vêm por bem. Do Brasil, mais especificamente do Fluminense, veio o então capitão da selecção brasileira: Ricardo Gomes. Juntando-se ao Mozer, o Benfica passou então a ter a dupla de centrais titular do Escrete. E embora corra o risco de ser acusado de clubite aguda, afirmo sem dúvidas que, para mim, os benfiquistas tiveram durante a época de 1988/89 o privilégio de ver no seu clube a melhor dupla de centrais que alguma vez passou pelo futebol português, e que na altura seria também uma das melhores duplas do futebol mundial. Era uma confiança total aquela que esta dupla me dava em termos defensivos. E depois havia ainda a parte atacante, porque o Ricardo e o Mozer juntos valeram cerca de 20 golos essa época.
O Ricardo Gomes era o meu ídolo. Em termos de admiração, conseguiu até superar a que eu tinha pelo Mozer. Porque vê-lo jogar era ver a mais pura classe em campo. Era um central duro, mas sem ser violento. Inultrapassável no jogo aéreo (para mim era ainda mais forte que o Mozer neste aspecto), parecia fazer tudo com uma calma imperial. Nunca havia aflições, e saía quase sempre a jogar, com a bola bem colada ao pé esquerdo. Nos lances de bola parada, era o terror dos adversários, e marcava golos suficientes para justificar esse medo (julgo que numa das épocas chegou a marcar 13 golos). Sempre que havia um livre ou um canto, eu não tirava os olhos do Ricardo desde que ele chegava à área adversária. Estava sempre à espera de um golo. Tenho mesmo a recordação de ele ter marcado um dos golos mais bonitos que vi, num pontapé acrobático à entrada da área contra o Dnepr Dnepropetrovsk, na segunda mão dos quartos-de-final da Taça dos Campeões (tenho a certeza de que foi um golo espectacular, mas a verdade é que não vejo imagens desse golo há quinze anos, por isso posso estar a romantizar um pouco o lance...).
Foi o primeiro estrangeiro na história a capitanear a equipa do Benfica, e não consigo pensar em mais nenhum que fosse, aos meus olhos, mais digno desse feito. Era um senhor dentro do campo, respeitado por toda a gente. Quando o Artur Jorge foi para o PSG em '91, levou-o, juntamente com o Valdo, mas trouxe-o de volta em 1995/96 para fazer uma última época. Já não era o mesmo Ricardo que eu conhecia, porque tinha perdido muita velocidade, e confesso que me fez alguma pena que esta última época viesse de alguma forma 'estragar' as memórias que eu tinha dele. Não que ele tivesse jogado mal, ou feito uma má época. Até ganhámos a Taça de Portugal nesse ano, mas tudo o que ele fez durante esta última época foi pálido, muito pálido quando comparado com o brilho da sua primeira passagem.
O Ricardo é o meu maior ídolo do Benfica desde que considero que comecei a perceber minimamente o futebol. Em termos de admiração desde que me lembro de ser benfiquista, talvez só seja suplantado pelo Nené, mas esse era uma daquelas admirações quase irracionais de infância (era o tipo que marcava os golos).
19 Comments:
O Ricardo também era o meu ídolo, talvez por jogar na mesma posição que eu. Era um jogador de uma classe incomparável. E ao contrário de ti, passei a admirá-lo ainda mais quando regressou, pois tinha menos velocidade e fazia tudo baseado na impressionante leitura de jogo que tinha. Um senhor!
Farrtei-me de chorar quando foi para Paris e também quando foi expulso com a Argentina (em 90, salvo erro). Era eu um miúdo...
Grande, grande Ricardo! Mas temo que seja mauzito como treinador...
Essa dupla era fenomenal, mas o Ricardo era melhor.
Superman Torras: o GR que referes era o Silvino (não o Louro), que era um baixote mas saltava imenso. E depois de ler a tua descrição, recordei-me desse golo.
João: Quando o Ricardo voltou, é óbvio que ele tinha que se basear mais no bom posicionamento e leitura de jogo que tinha, porque já tinha perdido velocidade (e a mim parecia-me sempre um pouco preso de movimentos). A mim custou-me vê-lo nesse regresso porque apesar de continuar um bom jogador, era um jogador diferente do grande Ricardo da primeira passagem, e quem não se lembrasse dessa primeira passagem poderia ficar com uma ideia diferente dele.
Já agora, e apesar do Brasil em '90 ter o Mozer (que já nem era do Benfica), Ricardo Gomes, Aldair (que saiu nessa época) e Valdo, eu estava pela Argentina nesse jogo. Primeiro porque eu nunca torço pelo Brasil em Mundiais (mas simpatizo sempre com a Argentina); e segundo porque o Maradona é para mim o maior génio do futebol de todos os tempos. O passe que ele nesse jogo 'inventa' para isolar o Caniggia e decidir o jogo é uma coisa brilhante.
MAgnífico!!! Este faz parte dos cinco senhores que iluminaram a minha infância futebolística no que toca ao Benfica. Ricardo Gomes, Carlos Manuel, Jonas Thern, Valdo e Diamantino foram sem dúvida os jogadores que mais me marcaram nesse período.
Compreendo o que dizes relativamente aos diferentes períodos do Ricardo na Luz mas eu consigo guardar boas recordações do Ricardo "velho". Dentro das suas limitações físicas continuava a ser um grande central. E guardo as imagens do Ricardo no seu último jogo. No relvado, dois lances praticamente idênticos. Dominguez lançado em velocidade na ala e o lento Ricardo a fazer a diagonal tranquilamente, cerrando cada vez mais o seu espaço... E o Dominguez a tentar simulações e o Ricardo sempre sereno, marcando a zona sem pôr o pé e empurrando-a para a bandeirola de canto. Num dos lances o Dominguez ainda se safou com um lançamento lateral. No outro, nem se aperecebeu da ratice com que o Ricardo lhe ganhou a bola. E no final, aquela multidão gritando para Ricardo ficar mais um ano. Ele sabia que não tinha pernas para mais e nós, provavelmente, também. Mas mesmo assim... Era como se todos quizessem viver um sonho... Grande Ricardo!
"E embora corra o risco de ser acusado de clubite aguda, afirmo sem dúvidas que, para mim, os benfiquistas tiveram durante a época de 1988/89 o privilégio de ver no seu clube a melhor dupla de centrais que alguma vez passou pelo futebol português".
Boa! Já somos dois!
Se é verdade que houve outras boas duplas, nomeadamente no FCP (o que levava até a pensar que determinados GRs, como o Baía, eram fora-de-série), creio que nenhuma dupla teve a veia goleadora da dupla Mozer/Ricardo Gomes. Acho até que, nessa época de 88/89 (em que o Benfica foi campeão), o RG foi o segundo melhor marcador do Benfica.
De resto, nem acrescento mais nada à apreciação do Ricardo, pois já foi tudo dito no post e nos comentários.
Esse golo que ele marcou (não me recordo se contra o Dnepr se contra uma equipa de Moscovo, talvez o Spartak) foi verdadeiramente espectacular e também dos melhores que vi o Benfica marcar, sem qualquer exagero.
Superman Torras, eu ia exactamente descrever esse golo ao Espinho (também creio ter sido esse o adversário), mas antecipaste-te! Creio que o golo não surgiu directamente do canto, mas na jogada de insistência, em que a defesa do Espinho pareceu esquecer o Ricardo. E acho que ele dominou a bola +/- perto da marca de penalty (fico na dúvida se ele não terá mesmo dominado mal a bola, mas ainda bem, pq o golo resultante foi espectacular). Deve ter sido na época 88/89, em que o Benfica ganhou uma série de jogos por 1-0 ou 2-1 (tendo sido o Ricardo decisivo numa série deles).
D'Arcy, tb me lembro desse Silvino do Espinho, que devia ser ainda mais baixo que o Bento...
O golo foi contra o Dnepr, disso eu tenho a certeza. Foi fora, na segunda mão dos quartos-de-final da Taça dos Campeões, época de 1989/90. Tínhamos ganho por 1-0 na Luz a primeira mão (golo do Magnusson de penalty), e nesse jogo acabámos por vencer por 3-0, com o referido golo do Ricardo e dois golos do estrambótico Lima (que deve ter sido o jogador mais estranho que eu alguma vez vi no Benfica). Nessa época chegámos à final, que perdemos com o Milan.
Talvez o S.L.B., nos seus arquivos mágicos, tenha o resumo desse jogo, e o referido golo (acho que no último jantar de bloguistas ele disse que devia tê-lo).
Ok, D'Arcy, obrigado pelo esclarecimento.
De resto, até me recordava dos resultados (1-0 na Luz, 3-0 na Rússia, tendo sido neste jogo que o Ricardo marcou o tal golo) dessa eliminatória, mas não sei porquê, achava que o adversário era o Spartak Moscovo.
Os cabelo do Beto, com os seus "rebentos de soja" (como lhes chamou o Harry Lime), ao pé do do Lima, pode ser considerado convencional...
Falando em Harry Lime, também tinha a sua piada que ele fosse ao jantar... No fundo, o Benfica é o clube pelo qual ele mais se interessa...
Tb concordo foi o melhor central que tiveram até hoje!
É Dniepr.
e em 88/89 o Mozer (8 golos) e o Ricardo (3 golos) valeram 11 golos
;)
Obrigado pelo esclarecimento, mas esses golos são apenas no campeonato, ou em todas as competições? De qualquer forma, se calhar foi na época seguinte que o Ricardo marcou os tais treze golos, ou algo parecido. O que eu sei é que ele marcou 28 golos em quatro épocas, o que dá uma média de sete por época.
Quanto ao 'Dniepr', o nome oficial do clube é Dnepr Dnepropetrovsk (é assim que aparece, por exemplo, no site da UEFA) :)
Concordo contigo, D'Arcy. Apesar de o ter visto jogar, era novo demais para me lembrar bem do Humberto, portanto o Ricardo foi o melhor que vi até hoje. Era melhor que o Mozer na medida em que era menos caceteiro.
Em 88/89 marcou 8 golos para o campeonato enquanto o Mozer marcou 2 (e mais um na Taça Uefa). Em 89/90, marcou 2 no campeonato mais 3 na Taça dos Campeões e em 90/91 marcou 9 no campeonato, sendo esta a sua melhor época em termos atacantes.
Não tenho a tua "má" impressão, D'Arcy, em relação ao último ano
em que esteve no Benfica (ainda marcou 4 golos), mas também com Paredões, Paulos Pereiras e Kings ao lado... :-)
P.S. - "Checka" o teu email... ;-)
Brilhante! O meu obrigado mais sincero por esta 'prenda' :)
Correção, Ricardo na soma das competições :
88/89 - 8
89/90 - 5
90/91 - 9
95/96 - 4
Pelo menos é o que está no Almanaque do Benfica.
Bem, no livro 'Memorial Benfica - 100 Glórias' são mencionados 28 golos. Foi daí que retirei o número.
Já agora, uma dupla correcção a moi même: quando mencionei a vitória de 3-0 como sendo na Rússia, não só não foi na Rússia (pq Dniepr, Dnepr ou whatever fica na Ucrânia), como também na altura, a Ucrânia (bem como a Rússia) estavam integradas na U.R.S.S. (embora não por muito mais tempo...) - não que tenha grande importância neste contexto, mas senti-me compelido por mim mesmo a fazer esta correcção...
... ou melhor ainda, o clube Dnepr, sendo da Ucrânia, está localizado na cidade de Dnepropetrovsk, que é banhada pelo rio Dnepr (que, por sua vez, nasce na Rússia, atravessa a Ucrânia e desagua no Mar Negro, já na Bielorrússia).
Não me digas que és cunhado do S.L.B. ;)
Confirmo que não somos parentes, mas somos da mesma "família"! :-)
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