domingo, fevereiro 27, 2011

Tudo

Tudo. Esta equipa, estes jogadores merecem tudo. Todo o apoio que nós possamos dar-lhes. São uma equipa à Benfica, com garra de campeã, e que esta noite soube lutar contra o azar, um guarda-redes em noite sobrenatural, o árbitro, o cansaço, o destino, e ir lá bem ao fundo buscar as últimas forças para nos darem uma vitória tão difícil quanto merecida. Seria uma injustiça atroz o Marítimo não sair derrotado da Luz.

O Benfica, com o Jardel no lugar do castigado Sídnei, mostrou desde o apito inicial aquilo que viria a ser o jogo: ataque constante, com o Marítimo juntando linhas, encostado à sua área. A primeira oportunidade de golo demorou pouco a surgir: com três minutos, um mau alívio do guarda-redes colocou a bola no Saviola, que falhou o chapéu por pouco. Infelizmente para nós, o erro inicial do guarda-redes não foi de forma alguma exemplificativo daquilo que viria a ser o desempenho dele no resto da partida, já que daí para a frente arrancou para uma exibição quase sobrenatural. O Benfica, insistindo sobretudo pela direita, e com o Aimar a pegar na batuta, foi dominando o jogo como queria, e a história da primeira parte resume-se praticamente a um massacre constante do Benfica à muralha defensiva do Marítimo, que ia sobrevivendo como podia. Aparecia sempre um pé ou uma cabeça a cortar a bola, por vezes até um braço, ou então era o seu guarda-redes que se mostrava intransponível, defendendo tudo o que lhe aparecia. Nos últimos dez minutos a equipa pareceu abrandar um pouco o ritmo, não deixando no entanto de continuar a atacar, e viu mesmo um grande remate do Gaitán (de pé direito) levar a bola ao poste.

O nulo ao intervalo era injusto, e a injustiça continuou na segunda parte, já que o perfil do jogo em nada se alterou. Ataque constante do Benfica, e o Marítimo pouco mais fazia do que chutar bolas para a frente na esperança de aproveitar a velocidade do Baba ou do Djalma. O golo, no entanto, continuava a teimar em não chegar: o guarda-redes do Marítimo parecia cada vez mais inspirado, e continuava a defender tudo. Quando o Cardozo acertou na barra da baliza, muitos terão começado a lembrar-se de jogos como aquele empate a zero com o Boavista. O árbitro também não ajudava: numa jogada em que o Aimar é claramente derrubado à entrada da área (lance que daria o segundo amarelo ao Ricardo Esteves), ele decide em vez disso mostrar o amarelo ao argentino. O esforço constante do Benfica na procura do golo, aliado à sobrecarga de jogos, começava agora a ter consequências no campo, e nos últimos vinte e cinco minutos alguns jogadores já estavam visivelmente fatigados, demorando muito tempo a recuperar posições (ou nem sequer recuperando em alguns casos - Gaitán). O Marítimo foi aproveitando para se mostrar mais atrevido nas saídas para o ataque, mas as oportunidades continuavam a ser todas para o Benfica, tendo o guarda-redes do Marítimo brilhado mais uma vez, com uma defesa fantástica a um livre do Cardozo. E como tantas vezes acontece nestas situações, quando nada tinha feito para o merecer, o Marítimo chegou ao golo, num cabeceamento do Djalma após canto que levou a bola a entrar junto ao poste mais distante. Faltavam treze minutos para o final.

Em condições normais, a maior parte das equipas não teriam resistido a um soco no estômago destes. Mas nós somos o Benfica, e a nossa equipa, apoiada pelos fantásticos 55.000 espectadores que estiveram na Luz, arregaçou as mangas e não desistiu: cinco minutos depois estava reestabelecida a igualdade, com o Sálvio, já de ângulo apertado ao segundo poste, a corresponder a um centro do Coentrão na esquerda. Empolgou-se ainda mais a Luz, contagiando os jogadores, que se lançaram na procura da vitória. Por momentos reverteu-se ao início do século passado, e o Benfica passou a jogar em 2-3-5, com os laterais a juntarem-se ao Carlos Martins no meio campo e cinco avançados à sua frente: Salvio, Kardec, Saviola, Cardozo e Jara. O Benfica dava tudo por tudo, o ambiente criado pelo público era infernal, e o Marítimo agarrava-se ao empate com unhas e dentes como se a sua vida dependesse disso. Na baliza, o Marcelo continuava a fazer uma exibição surreal e defendia de forma quase impossível um cabeceamento do Kardec, levando a bola ainda a bater no ferro pela terceira vez no jogo. Aos noventa e dois minutos, golo do Luisão! Mas não, depois de ter visto o assistente correr para o meio campo, foi o árbitro quem descortinou qualquer coisa e invalidou o golo. Parecia que já não faltava acontecer-nos mais nada. Até que na última jogada do jogo, a bola foi despejada para a área e acabou por cair aos pés do Coentrão, que encheu o pé direito e meteu a bola no ângulo. Foi o fim do mundo. É por causa de momentos destes que amamos este jogo. A justiça ao cair do pano, a recompensa merecida por quem tanto lutou por ela, o castigo para quem não merecia tanta sorte, a comunhão perfeita entre equipa e público. E não tenho grandes dúvidas de uma coisa: mesmo que o remate do Coentrão tivesse ido para fora, mesmo que o jogo tivesse acabado empatado, a nossa equipa hoje sairia de campo debaixo de uma chuva de aplausos. Não se lhe pode pedir mais do que aquilo que deram hoje.

O homem do jogo é o Coentrão. Numa altura em que já mostrava claros sinais de cansaço, ainda arranjou forças para ganhar a linha e assistir o Salvio para o primeiro golo, e depois, num último fôlego, marcar o golo decisivo. O Aimar foi o motor do nosso ataque, mas foi perdendo fulgor à medida que o cansaço se foi acumulando. O Luisão esteve ao nível do costume, comandando toda a defesa e sendo ainda obrigado a algum trabalho extra, já que o Jardel pareceu hoje não estar ainda bem entrosado, e mostrou algumas dificuldades em acertar com a marcação ao ponta-de-lança do Marítimo. Muito importante também o papel do Javi, sobretudo na fase em que o Benfica já dava o tudo por tudo e ele era praticamente o único homem no meio campo, sendo responsável pela ligação entre os sectores e ainda tendo que acudir às dobras de todos os lados, porque muitos dos colegas já não recuavam. Acabou substituído a cinco minutos do final, porque já não dava mais.


Esta nossa equipa é digna da história do Benfica, e merece o lugar na história que já conquistou, estendendo hoje o registo de vitórias consecutivas para dezassete. Já o escrevi antes: há-de ser até à última gota. O título de campeão é nosso, e defendê-lo-emos enquanto for humanamente possível. Contra tudo o que nos atirarem. Podem roubar-nos o título, mas vão ter que suar para conseguirem esse roubo, e hão-de ter que acender uma velinha a Cosmes e Olegários para agradecer o título.

quinta-feira, fevereiro 24, 2011

Carácter

E pronto, depois dos ameaços em épocas mais recentes (Hertha, Nuremberga), o Benfica conseguiu finalmente matar o borrego alemão e vencer um jogo naquele país. Mas o mais importante nem foi tanto a vitória, mas sim a forma como ela foi conseguida: com um enorme carácter e impondo o seu jogo. Com uma magra vantagem trazida da primeira mão, nunca o Benfica deu qualquer ideia de querer defendê-la, preferindo jogar à Benfica, e ir atrás da vitória.

Com duas baixas importantes - Javi suspenso, e Saviola indisposto - entraram os seus substitutos naturais na equipa: Airton e Jara. E sem surpresas, não foi por isso que a equipa abanou. No meio campo, o Aimar regressou à titularidade, ocupando o lugar que foi do Carlos Martins na passada segunda-feira. Talvez se esperasse que o Estugarda tivesse uma entrada forte no jogo, a pressionar-nos em busca do golo que os colocaria em vantagem na eliminatória. Mas quem apareceu a jogar com as linhas muito subidas e a pressionar logo à saída da defesa foi o Benfica, que logo aos sete minutos deu o primeiro sinal de perigo, com um remate em jeito do Gaitán que só não acabou em golo porque o guarda-redes - desta vez não jogou o Ulreich, que tantos problemas nos deu no primeiro jogo, mas sim o Ziegler - fez uma defesa fantástica. Acho que, sem exagero, os dois guarda-redes do Estugarda no conjunto dos dois jogos devem-nos ter 'roubado' uma meia dúzia de golos. A oportunidade flagrante que se seguiu foi novamente nossa, desta vez com o Coentrão, isolado, a ver o seu remate defendido mais uma vez. O Estugarda, nesta fase, ainda conseguiu ir respondendo e fazer algumas ameaças, mas sempre que conseguiu ultrapassar a nossa defesa encontrou pela frente um Roberto intransponível.

À meia hora de jogo, finalmente, o merecido golo, e um grande golo, por sinal. Depois de uma bola aliviada na sequência de um canto, surgiu o Salvio, ainda bem fora da área, a rematar de primeira cruzado e rasteiro para dar ao Benfica a merecida vantagem no jogo, e respectiva tranquilidade na eliminatória. E nem com este golo o Benfica resolveu descansar sobre a vantagem obtida. Mostrando mais uma vez uma organização defensiva impecável (não é por acaso que estamos há oito jogos, se não estou em erro, sem sofrer golos fora de casa) e capacidade para continuar a pressionar o Estugarda, até ao intervalo foi o Benfica quem continuou a controlar tranquilamente o jogo, e a deixar sempre a sensação de que de um momento para o outro o resultado poderia avolumar-se, quer através de jogadas colectivas - houve momentos deliciosos em que os nossos jogadores trocavam a bola entre si dentro do meio campo alemão, enquanto que os adversários corriam atrás da bola sem sequer a conseguirem cheirar - quer através de pormenores individuais dos nossos jogadores.

A segunda parte trouxe mais do mesmo: nos primeiros cinco minutos, duas oportunidades para o Benfica, primeiro pelo Jara, após passe do Aimar depois de uma bonita jogada pela esquerda, e depois pelo Gaitán, num lance em que o guarda-redes Ziegler acabou lesionado. Para o lugar dele entrou o maldito Ulreich, que mostrou estar tão inspirado quanto o colega que substituiu. Após a interrupção, o Estugarda teve um período de alguns minutos de maior pressão, mas sempre sem causar grandes embaraços à nossa defesa. O Benfica respondeu com mais duas grandes oportunidades, pelo Luisão, que rematou por cima, e pelo Cardozo, defendida pelo Ulreich. Voltou a responder o Estugarda, com duas oportunidades do japonês Okazaki: na primeira, o remate passou perto do poste, e na segunda, o seu cabeceamento foi defendido de forma espectacular pelo Roberto. Nesta altura eu já não temia grandemente pelo desfecho da eliminatória, mas sofria por querer acabar de vez com a maldição da Alemanha. Estava na altura de resolver o jogo, o que o Cardozo se encarregou de fazer quando faltavam pouco mais de dez minutos de jogo, com um livre 'à Cardozo' (já há algum tempo que não o fazia). Marcado na sua zona preferida - descaído para a direita, ainda um pouco longe da área - a bola foi o mais colocada que podia ser, embatendo num poste e depois rolando sobre a linha de golo até entrar junto ao outro poste. Agora sim, acabaram-se as dúvidas de que hoje venceríamos na Alemanha. E até final, ainda construímos oportunidades aumentar a nossa vantagem, mas a falta de pontaria (Gaitán) ou novamente o guarda-redes (Martins) negaram-nos o terceiro golo.

Desta vez não vou mesmo estar a fazer destaques. A equipa pareceu-me toda tão homogénea, com cada jogador a cumprir a sua função quase na perfeição, que seria muito injusto destacar este ou aquele. Todos eles, a começar no Roberto e a acabar no Jara, estiveram muito bem, e entram merecidamente para a história do Benfica com esta vitória.

A nossa equipa está, sem dúvida, no melhor momento da época. Melhor até, arrisco dizê-lo, do que a vi a época passada, porque me parece estar 'mais equipa', menos dependente de individualidades, e não abanando quando algum jogador nuclear está ausente. Hoje foram dois os ausentes, e no entanto creio que pouco ou nada se notou a sua falta. As vitórias sucedem-se, e às vezes até parece que são fáceis. Não são, e a de hoje foi mais um exemplo disso. O Estugarda não facilitou nada, correu muito e deu tudo o que tinha - eu vi-os, aos noventa minutos de jogo e com a eliminatória e o jogo mais que resolvidos, a correr desalmadamente atrás da bola e a tentar pressionar-nos na defesa. As vitórias acontecem, no entanto, não só devido ao talento dos jogadores e técnicos, mas também à forma séria e profissional como a nossa equipa tem encarado cada jogo. Mantendo esta atitude, só podemos esperar que as vitórias continuem.

terça-feira, fevereiro 22, 2011

Fases

Há uma teoria que diz que o ser humano, quando confrontado com a morte, passa por cinco fases distintas: negação, raiva, negociação, depressão e aceitação. Creio que esta noite, no Alvalixo, a lagartagem terá passado precisamente por estas mesmas fases quando confrontada com a superioridade inquestionável do Benfica sobre o seu clube - o que, bem vistas as coisas, será para a lagartagem de certa forma quase comparável à morte.

Fase um: Negação - Esta é a fase mais fácil de identificar. Afinal de contas, a enormíssima maioria da lagartagem passa quase toda a sua existência em negação. No mundo em que vivem - que, conforme já referimos diversas vezes, é povoado de fadas e unicórnios voadores, enquanto o whisky de malte jorra livremente de fontes - o sportém é um 'grande clube', dominador inquestionável do panorama nacional e internacional do corfebol e do aquatlo, e cuja equipa de futebol tem um plantel recheado de 'grandes valores', capazes de vencer qualquer equipa do mundo se jogarem 'à sportém' (ninguém conseguiu ainda descobrir o que é que isto significa, mas do ponto de vista de um observador externo julgo que andará próximo daquilo que o Grimi faz em campo). Só a negação explica que a lagartagem estivesse convencida que, de facto, tinha grandes possibilidades de vencer este jogo. Durante a semana andei a receber mensagens em que me prometiam ir 'tirar o título ao Benfica', entre outras pérolas. Mesmo quando o Benfica, praticamente na primeira jogada que fez no jogo, meteu o Coentrão, o Saviola e o Gaitán a trocar a bola por ali fora como se fosse tudo uma brincadeira até deixar o Gaitán isolado na cara do guarda-redes, a negação acabou, e aos dez minutos de jogo ainda recebia mensagens sobre um qualquer 'massacre' que estaria a decorrer no jogo. Era preciso algo mais violento, e o Salvio encarregou-se disso ao fim de quinze minutos. Aproveitando um corte defeituoso a um cruzamento largo do Gaitán, antecipou-se ao Grimi e bateu o Patrício com um remate rasteiro cruzado. O Grimi, quando já toda a equipa do Benfica festejava o golo junto à bandeirola de canto, conseguiu finalmente reagir ao lance e dar o primeiro passo em direcção à bola.

Fase dois: Raiva - Quando se levantou o véu da negação e a lagartagem se viu de repente, de forma brutal e sem anestesia, confrontada com a realidade da sua equipa, a reacção normal foi a raiva. E era o forcado sem sobrancelhas que não percebe nada daquilo (no início da época era melhor que o Jesus), o taberneiro do adjunto que é pior do que ele, o empregado do Chimarrão (Cristiano) que estava desempregado e agora é titular, o Cabeça de Cotonete que é uma besta (há um ano e meio andaram todos contentes aos saltos com ele enquanto cantavam 'E quem não salta é lampião'), os Maniches que são uma vergonha (é plural, porque continuo a não acreditar que seja só uma pessoa dentro daquela camisola; aquilo deve ser como aqueles números do circo em que não sei quantos palhaços se enfiam dentro de um Mini), e por aí em diante. Numa das bancadas a forma encontrada de descarregar a raiva era entrar num festival de bordoada com a polícia de choque - aposto que a Liga esta semana vai multar o Benfica por comportamento incorrecto do público, e vamos pagar mais do que o sportém. Enquanto se distribuía cacetada a rodos pela bancada, lá em baixo, no campo, o sportém tentava reagir ao golo recorrendo à táctica avançada de chutos para a frente, onde depois o Postiga se encarregava de finalizar todas as jogadas colocando-se de forma estratégica e sistemática em fora-de-jogo, esquecendo-se que já não joga pelos andrades, onde esse estratagema por diversas vezes dá frutos. Na bancada reencenavam-se agora as batalhas de Verdun, com avanços para cá e para lá entre os adeptos e a polícia de choque, mas sem ganhos significativos de terreno de parte a parte. Dentro do campo, reencenava-se um filme tantas vezes já visto: o Arturinho, piedoso, segurou ternamente o moribundo sportém nos seus braços, e diligentemente carregou-o para mais perto da área do Benfica, amarelando tudo o que era vermelho à primeira oportunidade, e apitando sempre que algum jogador vermelho se atrevia a meter o pé ou sequer encostar-se ao seu protegido. Não contente com isso, deu ainda um empurraozinho extra e expulsou o Sídnei com dois amarelos (o primeiro absolutamente patético) no intervalo de cinco minutos. Isto apaziguou a raiva da lagartagem por breves instantes.

Fase três: Negociação - Regressados do intervalo a perder apenas por um, e com mais um jogador em campo, a lagartagem volta, por breves instantes, a acreditar que ainda é possível safar-se desta. Fazem contas de cabeça e imaginam cenários do género 'Se marcarmos no primeiro quarto de hora...', ou 'Se entrar o Saleiro' (claro sinal de insanidade). O melhor que conseguiram foi uma iniciativa individual do Fernandez, que terminou com uma defesa brutal do Roberto (ele é mesmo mau, não é?), e uma cabeçada do Postiga ao lado, no único lance em que não foi apanhado em fora-de-jogo e onde tirou partido do Benfica estar momentaneamente reduzido a nove, já que o Jardel (tinha entrado ao intervalo para o lugar do Saviola) estava de fora a ser assistido. Cinco minutos depois (aos sessenta e dois), a esperança fugaz foi ao ar. O Gaitán pegou na bola, foi por ali fora e acabou travado em falta à entrada da área. No livre, a bola sobrou para o Javi, que insistiu e soltou o Maxi na direita da área, tendo este cruzado para o remate de primeira, e de pé direito, do Gaitán, que levou a bola a tabelar no Polga (que para pouco mais parece servir hoje em dia do que para se arrastar em campo e servir de pino para a bola tabelar nele) e a entrar na baliza.

Fase quatro: Depressão - Foi evidente e imediata. Eles já não eram muitos no estádio (trinta e seis mil, contando com os benfiquistas), e muitos dos que lá estavam começaram a levantar-se e a sair. Os que ficavam mais pareciam fazê-lo porque não tinham sequer a energia ou iniciativa necessária para se levantarem, ficando com ar quedo e mudo a olhar desconsoladamente para o relvado. O silêncio só não era sepulcral porque os Benfiquistas, num acto de piedade, começaram a gritar pelo sportém. E pelo Liedson, pelo Moutinho, pelo Costinha, deu para tudo. No campo, o sportém continuava a não imaginar forma melhor de ultrapassar a bem estruturada equipa do Benfica do que continuar a enviar chutões para as costas da nossa defesa. Nesta fase já nem era preciso o Postiga invalidar as jogadas ficando acampado, porque eles encarregavam-se de chutar as bolas quase todas directamente para fora. E foi até o Benfica, primeiro pelo Cardozo, e depois pelo Jara (que o substituiu) a levar algum perigo à baliza adversária. O Soares Dias bem se esforçou, amarelou o Roberto por queima de tempo, deu seis minutos de compensação, mas já não servia de nada, e nesta fase isso era só prolongar o sofrimento dos jogadores do sportém dentro do campo, e dos poucos que ainda resistiam nas bancadas.

Fase cinco: Aceitação - O árbitro apitou, o jogo acabou, e a lagartagem lá foi para casa carregando nas costas o peso de mais uma derrota e a confirmação (mais uma) de que jogam e valem muito pouco. Para o ano é que é.

Nos último jogos tenho dito várias vezes que é difícil escolher um jogador para melhor, e que o mais importante é o desempenho da equipa. Este jogo não foge a essa regra. Gostei de todos, e poderia elogiá-los um a um. A segurança do Roberto, com mais uma enorme defesa decisiva ou a liderança do Luisão. A calma do Jardel, que entrou neste jogo e até pareceu que já andava por ali há uma data de anos. O rigor táctico do batalhador Javi García, que continua a ser para mim um dos jogadores mais importantes desta equipa. A classe que o Gaitán teima em demonstrar: tem um toque de bola fantástico, e mesmo se por vezes parece alhear-se do jogo, parece que insiste em aparecer sempre para os momentos decisivos: fez o cruzamento para o primeiro golo, e marcou o segundo - tendo já sido dele a jogada que acabou no livre de onde resultou o golo. Não engana: é craque mesmo, e tenho a certeza que ainda ira melhorar mais. Comparações com o seu antecessor correm sempre o risco de ser injustas, mas é interessante comparar o que está a ser a primeira época do Gaitán com aquilo que foi a primeira época do Di María. Não sei qual terá sido o discurso dos responsáveis da lagartagem após o jogo, mas acho que poderia ser semelhante ao do Manuel Machado a semana passada: infelizmente para eles, o Benfica tem jogadores de classe superior, que em pequenos detalhes podem resolver jogos. Nós temos Gaitán, Saviola, Salvio, Aimar, Cardozo, Coentrão, e tantos outros. Eles têm o Grimi. E o Maniche. E o Polga. E tantos, tantos outros.

Mais a sério: é sempre agradável vencer em casa do sportém, quanto mais não seja porque é divertido vê-los descer à terra (e normalmente amortecerem a queda com a cara) e perceberem que de 'grande' só lhes resta a ilusão. Mas a verdade é que isto foi um resultado perfeitamente normal. O Benfica cumpriu a sua obrigação, e venceu um jogo que se impunha vencer, contra uma equipa que lhe é claramente inferior (já na primeira volta, quando estávamos em bem pior forma do que agora, e até estávamos atrás deles na classificação, a diferença de valor entre as duas equipas tinha ficado bem clara), e que apenas conseguiu vencer três jogos em casa nesta Liga. Não foi um feito extraordinário, mas sim uma boa noite da nossa equipa, que encarou o jogo e o adversário de forma séria e profissional. Mais uma vez, soubemos reagir às adversidades e dificuldades que nos foram sendo postas pelo adversário e pelos factores extra, como por exemplo um adepto dos andrades apostado em facilitar ainda mais a vida ao seu clube.

Tal como o Jesus, eu também me recuso a atirar a toalha ao chão na Liga, ou a facilitar o que quer que seja. Podem roubar-nos o título, mas vão ter que ser obrigados a suar para o conseguirem. Vão ter que nos tentar roubar mais, e vão ter que suar para conquistar cada ponto, sabendo que nós nos recusamos a desistir. Tal como venho dizendo desde a noite negra do Ladrão, o objectivo é pensar jogo a jogo e ganhar já o próximo. E depois pensarmos em ganhar o que se lhe segue. No final faremos as contas.

quinta-feira, fevereiro 17, 2011

Curto

Foi mais difícil do que se esperaria, mas o Benfica acabou por conseguir manter o registo 100% vitorioso em 2011. A vitória pela margem mínima é um resultado curto face ao domínio do Benfica, em especial na segunda parte, e é sobretudo o resultado combinado da eficácia do Estugarda e do desperdício do Benfica.

Onze sem surpresas, com o Jara a ocupar o lugar do ausente Saviola. Com alguma surpresa, foi o Estugarda quem entrou melhor no jogo, parecendo ter estudado bem o Benfica. Com um meio campo muito povoado, mantinham o Aimar sempre sob vigilância apertada, e fechavam bem as alas, em particular o nosso lado direito, onde conseguiam travar eficazmente o Salvio e as subidas do Maxi. O Benfica não conseguia libertar-se disto, e foi portanto atipicamente pouco perigoso durante os primeiros minutos, quase não criando oportunidades de golo. E após vinte e um minutos, com a típica eficácia das equipas alemãs, o Estugarda chegou mesmo ao golo. Bastou uma pequena desatenção do Coentrão, que não acompanhou a diagonal do médio do seu lado, para que este aproveitasse uma bola metida nas costas da defesa e depois finalizasse de forma perfeita, com um chapéu ao Roberto. O jogo mudou após o golo, e o Benfica pareceu acordar um pouco (ou foi o Estugarda que recuou), mas apesar de passar a ter algum ascendente no jogo, o Benfica continuava a revelar dificuldades para atacar com perigo e criar oportunidades de golo, sendo talvez neste período que mais se terá notado a ausência do Saviola e das suas movimentações. No entanto, o crescendo em que o Benfica terminou a primeira parte, encostando o Estugarda cada vez mais à sua área, deixavam antever uma segunda parte muito melhor do que a primeira, julgo que nos podemos queixar de um possível penálti não assinalado sobre o Coentrão, já perto do intervalo, num daqueles lances clássicos em que o guarda-redes não chega à bola e acaba por tocar no jogador. Nove em cada dez lances destes acabam em penálti. Este, infelizmente, foi um daqueles que não acabou.

A segunda parte acabou por confirmar as indicações que o final da primeira parte tinha deixado, e teve muito pouco a ver com a má imagem que o Benfica deixou nos primeiros quarenta e cinco minutos. O Estugarda foi completamente encostado às cordas - deve ter demorado mais de meia hora até que conseguissem fazer um remate - e o Benfica foi acumulando oportunidades de golo. O sufoco acentuou-se ainda mais quando os nossos alas trocaram de posição, obrigando os médios que os acompanhavam a vir para dentro de forma a acompanharem as diagonais que faziam, e isto abriu muito mais espaço para que os nossos laterais subissem com perigo. Mas apesar de todo o domínio, a bola continuava a teimar em não entrar, ou por ineficácia nossa, ou por mérito do guarda-redes alemão, que em determinada altura mais parecia uma espécie de super-herói, defendendo remates que pareciam ser golo certo (por exemplo, do Aimar ou do Gaitán, para citar dois exemplos). Só a vinte minutos do final o enguiço foi quebrado, quando o Cardozo, com um remate de primeira após um alívio da defesa, conseguiu finalmente vencer a resistência do Estugarda. Não abrandou o Benfica, e depois de tanta infelicidade acabou por ser recompensado a dez minutos do final com um golo algo feliz, já que o remate do Jara, de muito longe, ressaltou num defesa e fez a bola passar sobre o guarda-redes, batendo na trave e depois para lá da linha (o Cardozo ainda confirmou o golo, mas a bola já estava mesmo dentro da baliza após o remate do Jara). A vitória do Benfica era uma justiça que este jogo merecia, ainda que a injustiça se mantivesse na margem escassa desta vitória. E a injustiça ainda poderia ter sido maior, já que na única oportunidade que criaram na segunda parte, através de um livre directo, os alemães atiraram a bola ao poste. E como que para confirmar que merecíamos mais, nos minutos finais o Benfica ainda voltou a desperdiçar mais quase uma mão cheia de oportunidades para marcar - as mais flagrantes pelo Kardec e Javi, de cabeça, e pelo Menezes e Cardozo.


Não consigo escolher alguém para melhor em campo com muita clareza. Mas elogio o jogo feito pelo Maxi, em especial quando se conseguiu libertar na segunda parte. Do outro lado, o Coentrão também correu quilómetros. O Jara merece sempre ser mencionado pelo menos pela atitude, pois mesmo se as coisas não correm bem, ele nunca desiste de lutar e de tentar. Gostei também, como vem sendo habitual nos últimos jogos, do Gaitán.


A vitória desta noite dá-nos uma vantagem mínima na eliminatória, cujo desfecho continua completamente em aberto. O jogo mostrou que somos muito superiores ao Estugarda, mas todos sabemos da malapata que temos com equipas alemãs, e em particular nos jogos realizados na Alemanha. Para além disso, não poderemos contar com o Javi no jogo da segunda mão. Vai ser preciso um Benfica ao seu melhor - e muito mais eficaz - para ultrapassarmos o Estugarda.

domingo, fevereiro 13, 2011

Showtime

Não é que eu precisasse de grandes demonstrações, mas se alguém tinha dúvidas sobre a justeza das afirmações do Jorge Jesus de sermos a equipa que melhor está a jogar em Portugal, penso que o jogo desta noite terá sido brutalmente esclarecedor. O Benfica literalmente massacrou o Guimarães, que não é propriamente das equipas mais fracas da nossa Liga, e teve períodos no jogo que se podem mesmo classificar, plagiando a famosa expressão sobre os Lakers dos anos 80 na NBA, de 'showtime'.

Começando o jogo com aquele que poderemos classificar de 'onze base' desta época, o Benfica não perdeu tempo para mostrar que queria resolver o jogo depressa e bem. Não foi só a entrada no jogo: na primeira meia hora o Benfica foi um autêntico rolo compressor, com vagas de ataque sucessivas, oportunidades de golo umas atrás das outras, e uma posse de bola a roçar os 80%. Pressão muito alta, jogadores em constante movimento num autêntico carrossel, isto perante um Guimarães que se limitava a sobreviver como podia, e pouco mais conseguia fazer do que despejar a bola para a frente enquanto tentava respirar entre dois ataques do Benfica. Aguentaram vinte e quatro minutos (antes disso, já o inefável Nilson tinha tido uma das suas habituais lesões graves na Luz, obrigando a uma interrupção, tentando quebrar o ritmo do jogo), até que o Sídnei, num cabeceamento após canto do Aimar, desfez o nulo. Não abrandou o Benfica com o golo, e continuou a submeter o Guimarães a forte pressão, tendo o Salvio acertado no poste minutos depois. Só nos últimos dez minutos o Benfica abrandou um pouco a pressão, continuando no entanto a dominar o jogo com toda a autoridade, e acertando mais uma vez no ferro da baliza, desta vez pelo Gaitán em recarga a um remate do Maxi. A vantagem mínima ao intervalo era claramente insuficiente para o domínio avassalador do Benfica.

No início da segunda parte, felizmente, o Benfica encarregou-se de colocar imediatamente um pouco mais de justiça no marcador.
Depois do Aimar ter assistido o Sídnei no primeiro golo, os papéis inverteram-se: passe longo do Sídnei e depois a classe do Aimar fez o resto: dois toques apenas, o primeiro para controlar a bola de forma fantástica, e o segundo para a fazer passar pelo Nilson e parar no fundo da baliza. Se alguém tinha esperança ou medo de ver uma daquelas injustiças atrozes em que o futebol às vezes é fértil, este golo encarregou-se de afastar esse cenário. A vencer por dois, e com um jogo a meio da semana, o Benfica naturalmente não precisou de voltar a empregar o ritmo da primeira parte, e foi gerindo o jogo com tranquilidade. Mas a gestão de jogo do Benfica, apesar de permitir que o Guimarães tivesse um pouoc mais de bola, não impediu que continuássemos à procura do terceiro golo, que esteve perto de acontecer (ou aconteceu mesmo). Primeiro foi o Cardozo a introduzir a bola na baliza, mas o golo foi anulado por um fora-de-jogo duvidoso. Depois foi o Saviola a marcar, mas mais uma vez o golo foi anulado pelo árbitro. E muito mal anulado, pois não houve qualquer infracção no lance - segundo jogo consecutivo com um golo muito mal anulado ao Benfica.


A quinze minutos do final, penálti para o Benfica, que o Cardozo se encarregou de transformar muito mal, atirando para a bancada (acho que metade das vezes que ele tenta marcar para aquele lado, sai asneira). Só a cinco minutos do fim o Guimarães teve uma verdadeira oportunidade golo, mas a exemplo do que tem feito nos últimos jogos, o Roberto fez uma enorme defesa e negou o golo a um remate cruzado do isolado Edgar. E para fechar o jogo com chave de ouro, nada melhor que um grande golo. O Coentrão já tinha ficado muito perto de marcar um minuto antes, rematando ao lado após mais uma boa jogada do Benfica. Mas no último minuto do tempo de compensação o Carlos Martins recebeu a bola à entrada da área, e dali fez um chapéu perfeito ao Nilson para colocar o resultado em números um pouco mais justos. O Benfica acabou por vencer por três a zero num jogo em que ainda enviou duas bolas aos ferros, teve dois golos anulados, e falhou um penálti. Isto dá uma leve ideia dos números que o resultado final poderia ter atingido.

Não é fácil destacar alguém após um jogo destes, em que a equipa num todo voltou a estar a um nível excelente. O Sídnei continua a querer mostrar que não teremos muitos motivos para chorar a saída do David Luiz. O Aimar esteve excelente, e o golo que marcou está apenas ao alcance de muito poucos jogadores. Grande jogo do nosso lado esquerdo, onde o Coentrão e o Gaitán, sobretudo naquela primeira meia hora, estiveram brilhantes. E regressado ao nível do costume anda o Maxi Pereira, que voltou a fazer daquele lado direito uma auto-estrada para as suas constantes viagens entre a defesa e o ataque.

Impressionante também a moldura humana esta noite na Luz: cinquenta e cicno mil espectadores, uma assistência mais do que merecida para o futebol com que a nossa equipa nos tem presenteado. A equipa está claramente de regresso ao nível da época passada (se é que não está ainda melhor), e a onda vermelha parece estar de volta. Só é pena que haja quem ainda repouse sobre uma almofada de pontos roubados, e assim nos impeça de disputar o lugar que merecemos.

domingo, fevereiro 06, 2011

Difícil

Não teve talvez o brilhantismo da última, foi difícil e exigiu muito trabalho, mas não deixou de ser merecida a vitória que conseguimos esta noite no Bonfim, contra dois adversários: um brioso e outro manhoso.

A ausência inevitável do Coentrão foi a única mudança em relação à equipa que venceu no Porto - o Peixoto recuou para lateral, e entrou o Aimar para o meio campo. O Setúbal teve uma boa entrada no jogo, que deixou desde logo antever nos primeiros minutos que não teríamos uma noite fácil. O Benfica não conseguia pressionar de forma muito eficaz (não apenas por culpa própria, mas lá iremos) e falhava também mais passes do que é habitual, muito por culpa da agressividade e pressão intensa que os jogadores do Setúbal conseguiam exercer. Após os primeiros quinze minutos, melhorámos um pouco, mas a toada da primeira parte foi essencialmente de equilíbrio. As melhores ocasiões de golo que criámos foram ambas pelo Luisão, na sequência de bolas paradas. Primeiro de cabeça, e depois num remate acrobático, após ter dominado a bola com o peito. Em ambas as ocasiões, o guarda-redes do Setúbal acabou por defender com a ponta dos dedos. Só em período de descontos, quando poucos esperariam, o Benfica desfez o nulo. Numa transição rápida para o ataque, após recuperação da bola no nosso meio campo, o Saviola fez um centro largo da direita para a esquerda, e depois apareceu o Gaitán, que rematou cruzado de primeira e de trivela para um grande golo.

Na segunda parte o Setúbal voltou a entrar bem, e nos primeiro minutos foi a vez do Roberto brilhar, evitando o golo do empate em duas ocasiões, opondo-se ao remate de um adversário isolado, e depois a um bom remate do Pitbull de fora da área. Respondeu o Benfica com um remate do Saviola que passou muito perto da baliza, e que pareceu ter reposto o equilíbrio no jogo. Passámos então por um período mal jogado - mas muito disputado - em que a bola passou grande parte do tempo na zona do meio campo, sem grandes ocasiões de golo para nenhuma das equipas. Quando faltavam pouco menos de vinte minutos para o final, o Benfica substituiu o Aimar e o Saviola pelo Carlos Martins e Jara, e estas substituições acabaram por se revelar decisivas. É que cinco minutos depois de ter entrado, o Jara acabou com as dúvidas no resultado. Foi mais uma transição ofensiva feita em velocidade, desta vez aproveitando um mau passe do Miguelito. A bola foi ter aos pés do próprio Jara, que lançou o Maxi na direita e depois foi finalizar, de forma acrobática, o cruzamento deste. Com o segundo golo sofrido, o Setúbal acabou, e nos doze minutos que decorreram até final o Benfica dispôs mesmo de mais oportunidades para ampliar o resultado - chegou mesmo a marcar, pelo Javi García, mas foi um daqueles lances que ao Benfica é sempre anulado.

Melhores do Benfica, para mim, Roberto, Luisão e Sídnei. Foram os esteios de uma defesa que voltou a não sofrer golos. Também gostei do Javi e do Gaitán, que continua a mostrar ter talento para dar e vender. Não gostei do jogo do Cardozo, e achei também que o Aimar esteve uns furos abaixo daquilo a que nos habituou.

Não é muito habitual falar de arbitragens, mas sinceramente cada vez mais acho o Cosme Machado um adversário perigosíssimo para o Benfica, ao nível de um Jorge Sousa. Grande parte do nervosismo que senti neste jogo foi devido a ele. Já nos roubou três pontos na primeira jornada, e hoje senti que tudo fez para inclinar o campo a favor do Setúbal. Um dos motivos para não conseguirmos pressionar eficazmente foi o facto de que à menor coisa, os jogadores do Setúbal deixavam-se cair, que o Cosme apitava logo. Pelo contrário, os jogadores do Setúbal estavam à vontade para andarem a morder os calcanhares aos nossos jogadores, que só muito dificilmente se marcavam faltas. Só mesmo com uma arbitragem muito habilidosa é que conseguimos o insólito de vermos a equipa que controlou mais o jogo e teve mais posse de bola acabar com mais do dobro das faltas do adversário (24 contra 10). E o melhor é nem estar a pensar em alguns dos amarelos que foram mostrados aos nossos jogadores.

Enfim, o que interessa mesmo é a décima quinta vitória consecutiva, e o manter do registo perfeito em 2011. Com mais ou menos trabalho, com maior ou menor brilhantismo, os adversários vão caindo aos nossos pés.

quinta-feira, fevereiro 03, 2011

Lição

Nota prévia: Peço desculpa pela extensão do texto. Comecei a escrever e foi difícil parar. Para quem não gosta de ler muito: ganhámos por dois a zero em casa do Porto, merecemos inteiramente a vitória, e a nossa equipa, num todo, esteve à beira da perfeição táctica.

E ao intervalo das meias-finais, o Benfica vai vencendo por dois a zero. E vence porque na primeira parte foi claramente a melhor equipa, conquistando uma vitória justa e merecida, que recompensa a frieza e disciplina táctica que soube manter durante todo o jogo. Não quero estar com conversas de 'banhos de bola', 'bailes' ou afins. Por norma, quando se ganha, tem-se tendência a aproveitar para menosprezar o adversário e achincalhá-lo. Não quero fazer isso, porque isso seria menorizar aquilo que o Benfica fez esta noite. Não é fácil anular o nosso adversário da forma como o fizemos hoje, muito menos no ambiente que sabemos ser habitual naquele sítio. O que assistimos esta noite foi a um jogo muito disputado, onde houve uma batalha táctica que foi, claramente, vencida pelo graúdo, que mostrou ter aprendido com os erros cometidos nos jogos anteriores, deu uma lição ao miúdo, e talvez o tenha deixado a pensar que afinal ainda não será propriamente o mestre que por vezes parece imaginar-se (ou que certos avençados insistem em querer transformá-lo). Se calhar hoje, se se referirem ao Jorge Jesus como 'Mestre da Táctica', já não serão capazes de o fazer de forma tão jocosa.

Já tinha escrito antes que as derrotas nos jogos anteriores contra os adversários desta noite tinham começado no meio campo. Se nós adeptos conseguimos ver isso, muito melhor o terá percebido o Jorge Jesus. Esperava-se que, por via disso, a nossa equipa sofresse alterações esta noite, com a entrada de um jogador para reforçar o meio campo, e a aposta generalizada seria no Airton (para mim o jogador ideal seria o Rúben, mas como sabemos, não podemos contar com ele). A escolha acabou por recair, com alguma surpresa, no César Peixoto (que estará mais próximo do estilo do Rúben do que o Airton estaria). O Benfica abdicou de ter um organizador de jogo puro, para em vez disso ter um médio que auxiliasse mais na luta do meio campo. Em termos práticos, o que se via muitas vezes era a equipa, quando sem bola, a organizar-se em 4-2-3-1, com o Gaitán, Saviola e Salvio a formarem uma linha nas costas do Cardozo. O Peixoto ajudou também a fechar o lado esquerdo, com a ajuda do Gaitán, com isto permitindo uma grande liberdade ao Fábio Coentrão para subir pelo seu lado, acabando este por ser um dos maiores desequilibradores do lado do Benfica.

Desde o apito inicial que deu para perceber que o jogo poderia correr-nos de feição. A começar pela própria atitude dos jogadores. Pareceram estar completamente alheados do ambiente doentio que se costuma criar naquele estádio sempre que o visitamos, aparentando bastante calma e concentração. A equipa, desde o primeiro minuto, esteve tacticamente muito arrumada, com os jogadores a mostrarem grande sentido posicional e muita entreajuda. A ocupação dos espaços foi muito bem feita, e isto permitiu à equipa estender-se no campo de forma a fazer uma pressão bastante alta sobre os jogadores adversários, sem no entanto deixar espaços cá atrás. O Porto, em diversas ocasiões, viu-se impedido de sair a jogar, já que os seus jogadores da defesa estavam constantemente sob pressão, e acabavam por ter que despejar a bola para a frente. O Benfica acabava por conseguir recuperar bolas logo nas tentativas do Porto de saída para o ataque, e logo aos seis minutos, numa ocasião dessas, foi recompensado. O Coentrão ganha uma bola ainda sobre a linha do meio campo (interceptando mais um passe longo vindo da defesa), combina com o Saviola, e apesar do mau passe deste, não desistiu do lance, o que lhe permitiu aproveitar uma ligeira hesitação entre o central e o guarda-redes para tocar a bola para a baliza. Se a equipa já parecia confiante no início do jogo, um golo tão madrugador ainda mais a terá deixado, enquanto que o oposto pareceu passar-se nos nossos adversários, que davam claros sinais de nervosismo.

A verdade é que nunca pareceu muito difícil à nossa equipa controlar o adversário. Jogadores como o Belluschi ou o Moutinho quase não tinham espaço para jogar - o primeiro só se destacou pelas simulações e provocações aos nossos jogadores, enquanto que o segundo quase que nem reparei que estava em campo. No centro, o Úlque não consegue ser decisivo, e foi quase sempre presa fácil para o Luisão ou o Sídnei, apenas mostrando alguns fogachos quando fugia dessa zona e caía para as faixas. Ao Porto restava esperar que fosse o Varela a conseguir fazer alguma coisa, e ele até foi, de facto, o jogador mais incómodo para nós, mas tinha sistematicamente que apanhar com o Gaitán, o Peixoto e o Coentrão a fecharem o corredor. Sem surpresas, foi ele quem criou a melhor oportunidade do Porto em todo o jogo, com um centro que o 'Ramés' não soube aproveitar. Pouco depois (aos vinte e seis minutos), o Benfica aumentou a vantagem para dois golos. Mais uma incursão do Coentrão pela esquerda, em combinação com o Gaitán, mas o centro foi interceptado pela defesa do Porto. Cometeram o erro de tentar sair a jogar, o passe foi mal medido, e surgiu o Javi a rematar de primeira, ainda de muito longe, fazendo a bola entrar junto ao poste. A perder por dois, sem grandes ideias nem espaço, durante o resto da primeira parte pouco mais se viu do Porto senão tentativas de arrancar faltas com quedas patetas e forçadas dos seus jogadores (Belluschi e Úlque em particular). O único momento de sobressalto foi um remate que o Úlque 'inventou', já sobre o intervalo, e que o Júlio César defendeu com alguma dificuldade.

Esperava uma entrada em força do Porto para a segunda parte, tentando reduzir a nossa vantagem o mais depressa possível, mas nada disso aconteceu. A equipa do Benfica continuou sempre a manter uma organização e calma impressionantes, e foi controlando o adversário sem quaisquer problemas de maior. Até que, decorrido o primeiro quarto de hora, assistimos a mais um episódio da infindável novela que decorre ano após ano, há mais de trinta anos, quando jogamos em casa do Porto. O Fábio Coentrão, que já tinha amarelo, faz uma falta sobre o Sapunaru ainda no meio campo do Porto, falta essa absolutamente normal, que não cortou qualquer lance de perigo (foi, conforme referi, ainda dentro do meio campo do Porto) nem teve qualquer violência. Imediatamente pressionado pelos jogadores do Porto e pelos urros da assistência (que, certamente desesperada, já estava a perceber que só muito dificilmente o rumo do jogo se alteraria), o árbitro finalmente cedeu à pressão e, acedendo ao pedido, mostrou o segundo amarelo ao Coentrão. O Benfica perdia um dos seus principais desequilibradores, e o Porto ficava com meia hora para tentar entrar na discussão de um jogo que praticamente nunca tinha estado ao seu alcance.

Enganaram-se aqueles que pensaram que o Porto tiraria dividendos desta expulsão a pedido. A expulsão do Fábio foi, aliás, o momento de maior regozijo que os adeptos do Porto tiveram durante toda o jogo. É que o Benfica rearranjou-se em campo - Peixoto para lateral, entrada do Aimar para o meio campo, e uma notável disciplina táctica do Gaitán - continuou a manter a concentração e organização, e nem por uma vez o Porto, apesar de passar a ter ainda muito mais tempo de posse de bola, conseguiu tirar partido da superioridade numérica, ou sequer criar uma oportunidade de golo digna desse nome. Pelo contrário, foi mesmo o Benfica quem acabou por ter a melhor oportunidade da segunda parte para voltar a fazer o marcador funcionar, quando o Cardozo, após um lance de insistência, acabou por conseguir furar entre três adversários e rematar, tendo o Hélton defendido por instinto com a perna, quando já se lançava para o outro lado, traído por um ligeiro desvio. A meia hora de jogo com o Benfica reduzido a dez foi passada ao som do 'Ser Benfiquista', entoado pelos nossos adeptos acantonados no cantinho do costume. Nem mesmo nos minutinhos finais, quando o Peixoto se lesionou e acabámos a ter que jogar com o Maxi a lateral esquerdo e o Airton a fechar o lado direito, o Porto conseguiu encontrar forma de desorganizar a nossa equipa e criar um lance de perigo.

Melhor do Benfica esta noite? Jorge Jesus. Por tudo o que já foi escrito antes. Só uma muito boa preparação deste jogo, com o adversário bem estudado, e a consciência e humildade para reconhecer erros anteriores é que pode explicar a forma quase tacticamente perfeita como a nossa equipa se apresentou hoje. E teve a coragem de fazer isto com a opção de risco no Peixoto. Sabemos qual é a opinião geral que os adeptos têm sobre este jogador. E não tenho dúvida que, caso as coisas corressem mal, seria precisamente por aí que iriam pegar para o atacar.

Quanto a jogadores, podia elogiar praticamente todos os jogadores um a um. Mas aquele que me encheu mesmo as medidas foi o Javi García. Acabei de rever o jogo há minutos, e não parei de me maravilhar com a quase perfeição táctica dele. Está em todo o lado a compensar os colegas. Fecha ao centro, juntando-se aos centrais quando é necessário, recupera bolas, corta jogadas dos adversários, e ainda arranjou tempo para ir lá a frente marcar o seu segundo golo consecutivo. Foi um gigante. Às vezes é-me difícil explicar o quanto eu admiro este jogador (sim, não é só o Saviola) e o orgulho que é vê-lo com a nossa camisola. Jogos como o de hoje são mais eloquentes do que qualquer discurso. Enorme também o Fábio Coentrão durante a hora que o deixaram jogar. Aproveitou muito bem o apoio que lhe foi dado sempre pelo Gaitán e pelo Peixoto para subir como gosta pelo seu lado, e voltou a marcar ao Hélton naquele estádio. Já deve estar a habituar-se. Quero mencionar também o Sídnei, porque tem agora a difícil tarefa de fazer esquecer o David Luiz. Conforme esperava, não foi por ali que a equipa abanou. Esteve seguríssimo, e não tenho dúvidas que, com o acumular de jogos a titular, vai melhorar ainda mais e confirmar o potencial que lhe reconhecemos. E já agora, falar também do Gaitán. Tem uma capacidade técnica fabulosa, que hoje foi mostrando em alguns pormenores, mas vimos sobretudo como ele consegue ser também um jogador tacticamente muito disciplinado. Quando comparado neste aspecto com aquilo que era quando cá chegou, há uns meses atrás, a evolução é brutal. Mérito do Jesus, que na altura afirmou várias vezes para quem o quis ouvir que ele tinha que ter tempo para aprender. Está mesmo a aprender. Finalmente, a menção habitual para a solidez e liderança do Luisão na defesa.

Se não estou em erro, esta foi a décima nona vitória da nossa equipa nos últimos vinte jogos disputados para competições nacionais - a excepção foi a noite negra na anterior visita ao Porto. Somos neste momento, claramente, a equipa em melhor forma, mais confiante, e que melhor está a jogar em Portugal. Temos que saber aproveitar e manter este momento. Orgulharmo-nos, mas não embandeirar em arco com o que conseguimos esta noite, até porque isto ainda não decidiu nada. A missão continua a ser a mesma: ganhar o próximo jogo. E depois pensar em ganhar o que se lhe seguirá.